segunda-feira, 13 de abril de 2009

A carne da vergonha

Este domingo de páscoa, depois do já costumeiro almoço em família, delicioso como só mamãe consegue fazer, tive de ir ás compras ali para os lados da 2ª circular a um centro comercial com nome de navegador cujo nome começa em C e acaba em O e tem as letras OLOMB pelo meio.
E lá, assisti a uma discussão passional insólita, digna de um filme de Woody Allen, melhor, duvido que mesmo alguma mente perturbada se possa ter lembrado de uma coisa assim.Um casal. Ele (doravante tratado por Tonico Bastos) na casa dos sessenta e cacetada, impecavelmente vestido de calça de pinças e colete, parecia saído de uma novela brasileira do estilo Gabriela cravo e canela, onde inclusivamente não faltava o bigodinho meticulosamente aparado. Ela, de raça negra, com pronúncia cabo-verdiana e francamente mais nova do que ele (a quem trataremos por Gorete), tinha ar de sopeira gordalhufa e denunciava o desconforto de, por alguma forma, ter de estar ali naquele momento.
Gorete deixava transparecer a condescendência de quem um dia se terá aproximado d'aquele homem, viúvo, sem filhos herdeiros, a quem em determinada altura, terá faltado a companhia. Pela conversa, percebi que moravam juntos, na casa d'ele com os filhos... d'ela.
Os dois, numa mesa da esplanada onde me sentei, estavam a lavar roupa suja a plenos pulmões:
"Vergooooonhaaa!!! Uma mulher que deixa os filhos e não vai dormir a casa!!" Tonico, fazia questão que toda gente ouvisse, qual plateia de jurados que haveria de condenar aquela mulher em hasta pública. "Foi bom, não foi? a noite inteira a f***r?! isso é que foi ...ao menos que tivesse vindo dormir a casa... vergonha!!" Tonico estava francamente revoltado, fora de si, denunciava a viva voz os pecados de Gorete e parecia tirar benefício daquele expurgar publico. Ela, encolhia os ombros, aceitando o castigo que lhe estava a ser aplicado, emitia uns sons envergonhados, resignada na sua culpa.
Foi um minuto que pareceu uma hora, e eu, perfidamente a assistir de plateia, intrigado com a atitude de Tonico Bastos. Ele, estava agastado não pela traição em si da companheira, mas mais pelo facto de ela não ter ido dormir a casa, como que aceitando que ela lhe fosse infiel, o que não podia ser, é não estar em casa à hora do café da manhã. "Nunca mais dormes fora de casa, ouviste!!" gritava, "para a próxima vou estar com os teus filhos, à tua espera ...que vergonha!". Gorete, soltava timidamente argumentos contraditórios, sem nexo, "Você tem de me respeitar, um homem tem de respeitar a mulher..."
Tonico Bastos e Gorete ali ficaram a esgrimir argumentos por entre a populaça que passava incrédula. Eu não sei como terminou a história, saí antes dos créditos finais. Mas aprendi que haverá alturas na vida, em que pior que a traição, é acordar sem ter quem lhe faça as torradas.

1 comentário:

Canuca disse...

Realmente já n se pode ir para a esplanada discutir, sem se ser incomodado por todos os outros que vão beber o cafézinho e ler o jornal...enfim...um descaramento lol