quinta-feira, 27 de dezembro de 2007

Eu vi "A Luz"

Caro leitor,
Como quase todos vocês saberão, eu gosto de beber, gosto mesmo. Bebo porque me dá prazer e faço-o desde tenra idade ou não fosse eu ter raizes em terras do Douro, a 1ª região vitivinícula demarcada em toda a história da humanidade. Apesar disso, a minha mãe sempre me disse que eu deveria evitar beber (muito), que a culpa era do meu ADN ser particularmente sensível e o meu fígado apresentar marcas deixadas pela hepatite juvenil. Talvez por isso eu sempre tenha procurado beber com alguma razoabilidade. Mas há alturas em que a emoção se sobrepõe à razão ...e eu sou um ser muito emocional. Chamem-lhes "distracções" ou "momentos de maior descontracção" aquelas alturas em que estamos a divertir-nos com os amigos, não temos pressa, nada que fazer, trabalhar, conduzir ou estar sujeitos a pressões de espécie alguma. É nestas alturas que o apelo alcoolico é mais forte que eu. Não quero, por isso, deixar passar em branco (tinto; cerveja e wiskie) uma experiencia que vivi e que me fez repensar a minha atitude perante o teor alcoolico. "Pronto, foi ao balão e acusou" dirão uns, "tem uma cirrose e o médico proibiu-o de beber" dirão outros. Não! o que me aconteceu foi uma simples e vulgar bebedeira, que de simples e vulgar não teve nada, diga-se. O cenário é o seguinte: baixa de Lisboa, jantar de amigos, restaurante recém-inaugurado, cheira a novo. Chego à hora marcada e constato que sou dos primeiros, ainda antes de me sentar peço a primeira das quatro cervejas com que engulo as entradas de pimentos, queijos e presunto serrano. Uma hora depois, começo a jantar a bela da costeleta de vitela grelhada com dois copinhos de tinto do Dão. A rematar o café e o habitual whisky irlandês carregado de gelo. Tudo dentro da normalidade (pensava eu), até porque já houve ocasiões em que havia emborcado bem mais. Ás páginas tantas, como se de uma falha de corrente eléctrica se tratásse -Desliguei !!! de repente, algo em mim fez quebrar o elo de ligação com a minha consciencia. Desde aquele instante, foi como se a minha alma adormecesse e se separasse do meu corpo. Contaram-me depois, que durante uma boa hora e meia, a minha pessoa, continuou a socializar obviamente acalorado pelos vapores etílicos, mas que manteve conversas sérias com os colegas; já na rua cumprimentou uma mão cheia de individuos; abraçou oliveiras; derrubou propositadamente caixotes de lixo; manteve uma pose pró-activa, até que um amigo, depois de me olhar sériamente nos olhos (diz ele) achou (e bem) que eu estava inconsciente dentro do meu corpo hiper-activo, num estado transcendental impossível de controlar. Nada mais havia a fazer que não fosse, conduzir a minha pessoa para casa. De manhã, acordo sereno para recuperar a racionalidade, guardo flashes fotográficos da noite de ontem, pedaços de um imenso puzzle. Oiço as versões de quem lá esteve, de quem me acompanhou. Incrédulo, pergunto-me como posso ter estado tão activo? quando a unica coisa de que me lembro entre a mesa do restaurante e o amontoado de roupa suja e esborratada de sangue aos pés da minha cama pela manhã, foi o tombo que dei e que está na origem desta dor incómoda que me assola o ombro e me esgadanhou o rosto. Desde essa noite, sou um homem novo. Considero esta experiência que convosco partilho, uma luz no caminho. A luz das estrelas que vi quando o meu crâneo embateu no granito fazem agora parte do meu sistema anti-excessos.